É assim, sem o menor apetite, que adolescentes devastados por transtornos alimentares retratam as refeições. Cientistas investigam por que esses distúrbios passam a assombrar, cada vez mais, quem mal saiu da infância
por IRACY PAULINA
Que a bulimia e a anorexia encontram presas fáceis na juventude, isso as estatísticas apontam desde que esses males se tornaram conhecidos da ciência. No entanto, mesmo olhando apenas para o período da adolescência, nota-se que esses distúrbios alimentares chegam cada vez mais cedo. Até que ponto dietas milagrosas, padrões de beleza irreais, comentários negativos de colegas e familiares - que sempre foram acusados de gatilho para esses transtornos - afetariam meninas e meninos que, talvez meses antes, ainda brincassem de boneca ou só pensassem em bola de futebol?
Em busca de respostas, pesquisadores liderados por Alison Field, epidemiologista especializada em pediatria, obesidade e desordens alimentares no Children's Hospital, em Boston, nos Estados Unidos, acompanharam durante sete anos nada menos que 6 916 garotas e 5 518 meninos de 9 a 15 anos. Uma das conclusões foi de que as ações preventivas devem variar de acordo com o sexo e a idade. "Meninas menores de 14 anos, filhas de mulheres com histórico de transtorno alimentar, correm um risco três vezes maior de manifestar um desses problemas", exemplifica Alison. Ou seja, não importa tanto se a garota admira a modelo esquálida ou pensa que fará sucesso nas primeiras baladas se for magérrima. Mesmo que não seja ligada nisso, ela merece atenção. "Já no caso dos garotos menores, o que pesa são os comentários negativos da família." Atenção: da família mais até do que dos colegas de turma.
Especialistas brasileiros ressaltam que nada disso, isoladamente, condenará uma criança a se tornar vítima da bulimia ou da anorexia. Outros fatores contribuem para esses problemas: perfeccionismo, depressão, ansiedade e transtorno obsessivo-compulsivo. "As origens dessas desordens são sempre multifatoriais", diz o psiquiatra Fábio Salzano, vice-coordenador do Ambulin, o Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do Hospital das Clínicas de São Paulo.
"Vamos ser claros: a anorexia é a única doença psiquiátrica capaz de matar 15% dos pacientes. Eles precisam de ajuda de médico, psicólogo, nutricionista", avisa o psiquiatra Táki Cordás, coordenador do Ambulin. Não imagine que seu filho, se tiver qualquer problema, pedirá esse socorro. "O anoréxico não acha que está doente, e sim gordo", explica a lógica o psicólogo e psiquiatra Marco Antonio de Tommaso, de São Paulo. A nova dica aos pais é: fiquem também ligados à meninada mais nova. Ela pode ser vítima.
A anorexia
A anorexia
O paciente sempre acha que está mais gordo do que de fato é e quer emagrecer a qualquer custo. Por isso diminui drasticamente a ingestão de comida, podendo ou não usar medidas purgativas, como vômito e laxantes. Há 16 garotas com o problema para cada garoto. Não importa o sexo, a maioria tem entre 12 e 15 anos.
A bulimia
O emagrecimento não é severo. O peso pode até ser normal ou quase. Mas há uma enorme preocupação em não engordar. Essa é uma idéia fixa. Aí, quase para compensá-la, bate uma tremenda vontade de devorar comida. Após o ataque de gula, sentindo-se culpado, o jovem vomita ou toma laxantes e diuréticos. No dia seguinte, exagera na dieta restritiva e nos exercícios. Por enquanto, as maiores vítimas ainda têm mais de 16 anos.
Perigo na internet
Os apelidos são engraçadinhos, mas o assunto não é nenhuma piada. Longe disso. Anas e Mias (abreviações de anorexia e bulimia) intitulam as páginas da internet hospedadas em comunidades de sites de relacionamento como o Orkut, servindo de estímulo para o emagrecimento a qualquer preço e pela adoção do transtorno alimentar como estilo de vida. "Esses jovens que se encontram na internet têm dificuldade maior de falar sobre o problema com os pais", observa a nutricionista Tâmara Erbert, autora de Anorexia e Bulimia Nervosas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário